sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Chernobyl económico

Existe algum fanatismo neo-liberal a soldo, irredutível no seu laissez-faire coute que coute, que vê o mundo a preto e branco: ou escolhemos a sociedade "livre" de Estado e de qualquer seu resquício para além de um exército, que nos querem ainda impingir, ou tudo o resto será alguma espécie de escolha esquerdista de socialismo-comunismo.

No fundo, a proposta desses indivíduos não anda longe da escolha induzida de um novo tipo de totalitarismo: o dos preços livres acima de tudo e não importa como, incluindo acima do valor da vida humana (que alguns deles defendem como verdadeiros fariseus).

Às vezes imagino que a espécie humana estará a dividir-se em duas, ou então que essa malta talvez tenha algum chip instalado atrás da orelha.

É que soam tão absolutamente convictos - mesmo face ao desastre completo das suas proposições - que me fazem lembrar os comunistas mais ferrenhos do Politburo Central Soviético pós 89.

Antigamente existiam as cassetes, agora é mais o blue ray... Como diria S. Agostinho, dai-nos Deus paciência para tolerar o que não conseguimos entender.

Reparem que quando se fala a essas pessoas do que acham da intervenção do Estado quando estão em maus lençóis, elas respondem: "É para isso que serve o Estado". Nem um pingo de má consciência...

Vamos então a uma analogia simples.

Imagine-se que a economia é como um reactor nuclear. Aquilo que queremos de um reactor nuclear é que produza calor, o calor aquece água, e essa água faz mover turbinas, que por sua vez geram electricidade.

O que produz o calor num reactor nuclear?

Os átomos que servem de combustível nuclear possuem uma dimensão que fica no limiar da estabilidade atómica. Ocasionalmente desprendem-se partes desses átomos (neutrões) que, quando embatem em átomos parecidos nas vizinhanças originam a sua cisão, libertando-se mais neutrões e muita energia, numa reacção em cadeia que gera bastante calor e que, se não for controlada, pode resultar em explosão.

Um reactor nuclear é uma explosão em potência mas a reacção no seu interior, alimentada por combustível atómico, ocorre a velocidades mais moderadas, para que não descambe nessa indesejada explosão.

O que modera essa velocidade de reacção são outros grupos de átomos capazes de absorver parte dos neutrões livres, por exemplo grafite. Imagine-se estes como sendo a regulação dos mercados.

Agora imaginemos que essa capacidade natural de cisão de átomos instáveis equivale ao volume de trocas económicas. Aprecie-se a curiosa analogia:

1. Economia planificada, de baixo débito de produto (como na antiga URSS): equivale a um reactor muito sub-aproveitado, onde imperam os elementos moderadores da reacção (o Estado, a burocracia, outros).

2. Economia de mercado com estado social (mais ou menos o que tínhamos na Europa até há uns quinze a vinte anos atrás): provavelmente o mais próximo a uma reacção equilibrada donde se extrai calor por muitos e longos anos, quase sempre em segurança.

3. Reactor sobre-aquecido: equivale à economia pouco antes de regredir, nomeadamente por falta de moderadores (regulação); antes da explosão tudo "parece" ir bem, com elevada produção energética, um número de neutrões livres sempre a crescer, muitíssimo mais calor até que... cabum!

Foi o que aconteceu à economia americana-europeia-japonesa: é uma história parecida com a galinha dos ovos de ouro em que os mais gananciosos pegaram numa doutrina relativa, fizeram dela conhecimento absoluto e praticamente indiscutível durante 25 anos ,e contagiaram todo o sistema para produzir mais, e mais depressa, sempre a aquecer, prego a fundo, sem regras, "sem mãos, sem pernas" e agora... sem dentes!

Seria bom abandonar essa ganância implícita nos modelos de maximização de crescimento per si e voltarmos a economias mais estáveis, que caracterizaram as fundações dos Estados Social, mesmo com os devidos ajustes relativos à demografia.

É essa a confiança que os cidadãos precisam de ganhar para voltarem às compras.

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