Um indicador utilizado para aferir do risco de incumprimento de países soberanos (o vulgar risco de "bancarrota"), é a medição do preço-aposta dos CDS (Credit Default Swaps), emitidos pelas entidades credoras para segurar o risco dos empréstimos que fazem aos estados nacionais.
Quanto mais cara uma unidade de seguro sobre 10.000 $USD (a unidade e moeda empregue acima), mais provável o risco de incumprimento.
Da tabela podem imediatamente retirar-se algumas conclusões:
- Os dois países com maior risco de incumprimento são a Venezuela (em 2º lugar) e a Argentina (em 1º lugar); o caso da Argentina deveria fazer pensar todos aqueles que defendem a hipótese de saída de Portugal do Euro como uma espécie de "ovo de Colombo"
- Há apenas dois países cujo risco desceu este ano: o Líbano e a Argentina (este último ainda em estado crítico, mas menos mal do que há um ano atrás)
- O risco de incumprimento subiu, em maior ou menor medida, para todos os outros países analisados, entre Julho de 2008 e Julho de 2009
- A Alemanha permanece com a dívida mais segura do mundo
- Dos países da UE com mais risco do que Portugal, salientam-se a Espanha, a Áustria, a Eslováquia, a Itália, a Irlanda, a Polónia, a Grécia, e a Bulgária (8 países)
Pode imediatamente apreciar-se também que - e não é um consolo - o problema da eventual insustentabilidade das finanças públicas, ou melhor, o risco de incumprimento do estado português, está longe de ser um exclusivo na Europa.
Na verdade - e sobretudo para os que respeitam o mercado - a tabela emite uma mensagem muito clara: as finanças dos estados soberanos do mundo estão, por assim dizer, todas "lixadas".
E sabendo que a economia mundial tem - à excepção dos últimos anos - vindo a crescer durante décadas, arrisco 3 causas, combinadas em maior ou menor grau consoante o país:
1º) A falta de regulação sobre os mercados financeiros que tem permitido desnatar - pelos sistemas financeiros em primeiro lugar e pelas grandes corporações "não-financeiras", por outro - as economias nacionais e os sistemas de gestão do colectivo, os próprios estados. Numa palavra: neoliberalismo.
2º) Más decisões e escolhas políticas, falta de vontade ou visão política, desperdícios de natureza variada nas máquinas estatais, e desequilíbrios fiscais profundos, intra e entre nações.
3º) A falta de coordenação internacional na antecipação e combate ao problema - muito por culpa dos "teólogos de mercado" a la Greenspan, mas também da diversidade ainda grande de blocos económicos em competição profunda.
Em suma:
- As finanças públicas mundiais estão agora num estado lastimável em quase todos os países do mundo, sem grandes excepções.
- Em muitos países o "lado fácil da colecta" está no limite (a taxação excessiva directa e indirecta dos contribuintes efectivos, saíndo como grandes prejudicados as classes médias, os pequenos e médios empresários e os novos empresários)
- O bolo que resta por colectar e que podia - e deveria - equilibrar os países e aliviar a pressão sobre o "lado fácil da colecta" requer grandes reformas políticas e de regulação, que ainda quase não tiveram lugar (as grandes fortunas pessoais e colectivas que fogem ao controlo de todos os estados, os off-shore, as lavagens de dinheiro que nunca foram combatidas a sério, e por aí fora - quase tudo resultado da excessiva liberdade na circulação de capitais).
Hoje, grandes interesses económicos demasiado poderosos e demasiado ocultos, bem como legiões de faltosos, criminosos, terroristas profissionais e outros "artistas", representam uma séria ameaça à soberania e liberdade política de muitas nações (noutros tantos casos a ameaça reside no próprio seio dos governos); esta ameaça não se limita ao mero poderio económico que compra ocasionalmente este ou aquele, mas que infiltra profundamente - ou já infiltrou - as instituições das democracias e a sua opinião pública.
A ameaça é credível e séria: é difusa, está oculta em grande parte, acumulou demasiado poder, e é atravessada por um interesses ultra-egoístas e sem escrúpulos: acumular mais dinheiro, comprar mais pessoas, mais opiniões, mais negócios e mais governos (sem que seja preciso, em muitos casos, recorrer à ilegalidade).
É verdade que a democracia associada ao mercado tem sido uma fonte de prosperidade social.
Mas só assim poderá continuar a ser, se à palavra mercado, se acrescentar o termo "regulado" (regulação eficaz, eficiente e fiscalizada, e não burocracia avulso de interesse encapotado).
Fora desse ponto de equilíbrio político-económico, percebe-se - exemplos no mundo não faltam - que o capitalismo desregrado e selvagem é compatível com qualquer sistema político, com excepção do comunismo (e mesmo nesse caso, temos a China).
O poder económico excessivo e o poder político entretanto já corrompido por esse pode ser a mais formidável ameaça à liberdade individual que paira sobre os povos de nações ainda tidas por "livres", ou "democráticas".
Estamos a entrar num momento de clarificações, de oportunidade para a mudança e, não obstante, num momento de perigo máximo.
Deste panorama, e após mais ou menos conflitos, tanto podem resultar mantas de retalhos de democracias "musculadas", e mais ditaduras, sempre e quando não exista o cuidado da liderança e de união contra uma ameaça global; ou um mundo um pouco melhor se se regular bem e a tempo; se se lutar contra a corrupção de interesses fora e dentro das máquinas públicas; se pelo menos os povos mais poderosos, mais interessados num certo ideal de civilização, estiverem ainda dispostos a recorrer ao "uso da força" para fazer valer as suas boas leis e expulsar ou derrotar a "má moeda" do seu seio.
Se se escolher ignorar a trajectória que leva a ameaça para se apostar em detê-la a tempo; se não emergirem líderes suficientemente corajosos; se os interesses económicos de poucos se tornarem tão poderosos que minem os interesses da maioria; então desembocaremos talvez numa nova era de trevas.
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