terça-feira, 3 de março de 2009

Uma tese sobre a (falta de) confiança

Uma tese pessoal, é a de que enquanto os agentes micro-económicos mais numerosos (os cidadãos em geral, as famílias, e a classe média em particular), não voltarem globalmente a adquirir algum sentimento de que vivem numa sociedade estável, a actual crise não passará.

A tese é de que a falta de confiança não diz apenas respeito ao sistema financeiro, mas a todo um modo de vida progressivamente mais "selvático" e humanamente difícil de aceitar.

Os indícios para tal são diversos e numerosos: a relativa insatisfação social e individual - infelicidade - típica às sociedades mais consumistas, a falha sucessiva da taxa de natalidade nos países industrializados, as sucessivas e tendencialmente excessivas transferências de risco de um sistema de responsabilidade colectivo (Estado) para cada indivíduo, as distorções às funções do Estado motivadas por grandes interesses económicos multi-nacionais, a entrega de grandes fatias da economia não ao serviço da concorrência mas ao enriquecimento de uma minoria, a falha progressiva dos valores sociais, o desmembramento crescente das famílias, o aumento da criminalidade sóciopata, o abandono dos idosos à sua sorte, a defesa cega e repetitiva de um estado de coisas obviamente insustentável (sobretudo pelos media, como sucede nas ditaduras); no fundo, a tentativa de extinção dos comportamentos cooperativos na sociedade - o sentido de comunidade - a favor de uma tremenda pressão para o individualismo, eufemisticamente designado por "liberdade".

Não se sabe ao certo porque durou tanto tempo a recessão japonesa (agora reeditada globalmente) mas poderá ter algo a ver com esta desilusão colectiva, com a degradação dos valores sociais básicos que o "homo economicus" nos vem impondo com cada vez mais peso.

Embora o gatilho da crise tenha muito mais a ver com "ilusão", o desânimo colectivo com o viver em permanente instabilidade pode ser o que está a motivar o seu arrastamento.

A espiral desdendente que só será realmente invertida se aos "pensos rápidos" se vier progressivamente juntar uma economia mais regulada, e sobretudo uma sociedade em regresso a valores éticos partilhados pela maioria e também permeados para os negócios.

Suponho que não seja um processo rápido, mas o caminho faz-se andando...

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