Texto de George Soros
"O euro é uma construção única e rara que, actualmente, está ser colocada à prova. Otmar Issing, um dos pais da moeda comum, definiu perfeitamente o princípio em que o euro foi fundado: o euro destinava-se a ser uma união monetária e não política. O Estados participantes definiram um banco central comum, mas recusaram, explicitamente, renunciar ao direito de taxar os próprios cidadãos e cedê-lo a uma autoridade comum. Este princípio ficou definido no Artigo 125 do Tratado de Maastricht, que desde então tem sido rigorosamente interpretados pelo tribunal constitucional alemão.
O princípio está, no entanto, errado. Uma moeda exige tanto um banco central como um Ministério das Finanças. O ministério não precisa de ser usado para taxar os cidadãos, mas precisa de estar disponível em tempos de crise. Quando o sistema financeiro está em perigo de entrar em colapso, o banco central pode fornecer liquidez mas apenas o Ministério das Finanças pode lidar com problemas de solvência. Este facto é conhecido e devia ter estado claro para todas as pessoas que estiveram envolvidas na criação do euro. Issing admite que esteve entre as pessoas que acreditaram que "iniciar uma união monetária sem definir primeiro uma união política era precipitado".
A União Europeia foi crescendo passo-a-passo de forma precipitada: estabelecendo objectivos e prazos limitados, mas politicamente alcançáveis, sabendo perfeitamente que não seriam suficientes e que seriam necessárias outras medidas no futuro. Mas, por diversas razões, o processo paralisou. A União Europeia está, em grande medida, congelada na sua forma actual.
O mesmo é válido para o euro. O "crash" de 2008 revelou os defeitos da construção do euro, já que cada membro teve de resgatar o seu próprio sistema bancário em vez de o fazer de forma conjunta. Estas questões atingiram o auge com a crise da dívida grega. Se os Estados-membros não podem dar o próximo passo, o euro pode desmoronar-se com consequências adversas para a União Europeia.
A construção original do euro definia que cada Estado-membro acataria os limites definidos pelo Tratado de Maastricht. Mas os anteriores Governos gregos violaram escandalosamente esses limites. O Governo de Papandreou, eleito em Outubro de 2009, com um mandato de colocar a casa em ordem, revelou que o défice de 2009 alcançou os 12,7% do produto interno bruto (PIB), o que surpreendeu as autoridades europeias e os mercados.
As autoridades europeias aceitaram um plano para reduzir o défice de forma gradual, mas os mercados não ficaram tranquilos. O prémio de risco das obrigações do Governo grego continua muito perto dos três pontos percentuais, privando a Grécia de muitos dos benefícios de pertencer ao euro - nomeadamente, ser capaz de refinanciar as obrigações do Governo à taxa de desconto oficial.
Com os actuais prémios de risco, existe o perigo real da Grécia não ser capaz de sair da situação em que se encontra, apesar das medidas que tomar, porque aumentar os cortes orçamentais pode deprimir ainda mais a actividade económica, reduzir as receitas fiscais e piorar o rácio da dívida face ao produto interno bruto. Dado este perigo, o prémio de risco não vai voltar aos níveis iniciais sem ajuda externa.
Esta situação é agravada pelo mercado dos credit default swaps (CDS), que estão enviesados a favor dos que especulam no pior cenário. No caso de CDS longos, o risco cai automaticamente se estiverem errados. Isto é exactamente o contrário do "short-selling"nos mercados accionistas, onde o risco aumenta automaticamente caso os investidores estiverem errados.
Depois de reconhecer a necessidade, o Ecofin comprometeu-se pela primeira vez, na sua última reunião, a "salvaguardar a estabilidade financeira da Zona Euro como um todo". Mas o Ecofin ainda não encontrou um mecanismo para o fazer, porque os actuais acordos institucionais não definem nenhum - apesar do Tratado de Lisboa definir as bases legais desses mecanismos.
A solução mais eficaz seria emitir, conjunta e separadamente, obrigações europeias como garantia para refinanciar, digamos 75% da dívida grega em vencimento, enquanto a Grécia cumpre os objectivos acordados, deixando que o país financie o restante valor da melhor maneira possível. Isto iria reduzir significativamente o custo de financiamento e seria equivalente aos empréstimos em tranches do FMI à medida que a Grécia fosse cumprido as condições.
Mas, actualmente esta opção é politicamente impossível porque a Alemanha opõe-se veemente à possibilidade se usar os seus grandes recursos para ajudar os membros gastadores. Sendo assim, é necessário encontrar acordos provisórios.
O Governo de Papandreou está determinado a fazer o que for preciso para corrigir os abusos do passado e tem um considerável apoio da opinião pública. Da parte da velha guarda do partido no poder, têm existido protestos maciços e alguma resistência mas o público em geral parece preparado para aceitar as medidas de austeridade desde que veja que os progressos estão a corrigir os abusos orçamentais - e existem muitos abusos para corrigir.
O apoio provisório vai ser suficiente para permitir que a Grécia seja bem sucedida, mas deixa de foram Espanha, Itália, Portugal e Irlanda. Em conjunto, estes países constituem uma grande parte da Zona Euro para se ajudada por acordos provisórios. A sobrevivência da Grécia deixa ainda em aberto o futuro do euro. Mesmo que a União Europeia consiga resolver a crise actual, será que vai conseguir resolver a próxima?
O que é necessário é evidente: mais controlo intrusivo e acordos institucionais para uma assistência condicional. Além disso, seria desejável que existisse um mercado de obrigações europeu bem organizado. A questão é se é possível gerar vontade política para tomar estas medidas."
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