Cumprem-se hoje 65 anos desde a chegada das primeiras tropas soviéticas a Auschwitz - Birkenau (Oswiecim em Polaco).
O maior complexo de campos nazi, o mais tristemente célebre após 1945, conta porém apenas uma pequena, embora especialmente horrível, parte da história da ignomínia humana.
Celebrar a libertação de Auschwitz é largamente incompleto, se calhar ofensivo, sem recordar as dezenas de outros campos nazis espalhados por toda a Europa (imagem acima), sem lembrar os Einsatzkommando ou, da mesma forma, os ghettos dessa época, de antes e depois da guerra, todos os Gulag, os prováveis e ainda secretos campos de concentração Chineses em operação no dia em que estas linhas se escrevem, ou até os países dos nossos dias transformados em campos de concentração não menos terríveis.
Lembremos igualmente que a 27 de Janeiro de 1945, as tropas soviéticas encontraram apenas cerca de 7.500 prisioneiros, parte dos quais viria a falecer nos dias subsequentes. Os restantes, ou já tinham sido eliminados, ou arrastavam-se a esse preciso momento em marchas forçadas brutais e mortíferas a caminho de outros campos nazis, como Bergen-Belsen.
Auschwitz é uma simplificação da epítome da capacidade para o mal, individual e colectiva, que existe em todos e cada um de nós; e como todas as simplificações, tem o seu quê de perigoso e redutor.
O perigo consiste em permitir-nos eventualmente pensar a capacidade para o mal "absoluto" como algo apenas inerente "aos outros", ou pior ainda "a certos povos" (como o Alemão...), quando na realidade essa capacidade é praticamente transversal a todos, tal como o seu inverso, a capacidade para fazer o bem. Os extremos mais não são do que desvios atípicos, que cristalizam a estupefação da maioria e a fazem facilmente esquecer que aquilo que a distrai é o espelho da sua própria natureza levada ao limite.
Auschwitz apresenta-nos um passado cada vez mais distante de uma memória terrível, hipnótica, surreal, através duma algo enganadora atmosfera de museu. A realidade mostra-nos eventos tão ou mais horrendos decorrendo a toda a hora, sob as mais diversas formas, perpretados por pessoas contra outras pessoas.
Sucede apenas ser-nos mais fácil julgar de forma quase absoluta um passado distante, do que reagir em tempo real às atrocidades do nosso próprio presente.
Auschwitz ainda existe, apenas se transfigurou; tenho dúvidas de que algum aspecto daquilo que representa possa ser algum dia verdadeiramente celebrado, ainda que se trate de uma "libertação".
Bebinca
Há 49 minutos
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