O défice das contas públicas de 2009 é de facto feio - 9,3% - e superior (bem superior) ao que o governo estimava antes das eleições e mesmo antes do fim do ano.
Admito que seja plausível supor-se que poderá estar na base disso uma estratégia de adaptação progressiva da realidade negra dos números à opinão pública, sobretudo tendo-se atravessado uma época eleitoral e um último trimestre importante para o consumo privado.
Por outro lado, a turbulência sobre as contas públicas em 2009 foi de facto mais violenta e mais dinâmica do que aquilo que é costume em anos de crise "normais".
Quer isto dizer que é igualmente plausível assumir que a rápida deterioração do desemprego pode, quase por si só, explicar a situação dum défice real claramente superior ao antecipado pelo executivo, por via da inerente subida de custos sociais e simultânea diminuição de receitas.
Mas o problema não reside na relativa gestão de espectativas a que o governo se viu "obrigado" entre Agosto e Dezembro de 2009, que era de esperar da parte de qualquer governo não-suicidário e algo dependente de juízos externos ao país sobre o estado da sua economia; nem reside nos efeitos de distorção anómala que a degradação rápida da situação económica de 2009 gerou, com efeitos amplificados sobre quaisquer previsões por via do atraso estatístico na compilação final dos dados económicos relativos a 2009. Tudo isso é aceitável.
O problema reside antes na falta de perspectiva - ou excessivo calculismo político - do executivo entre Setembro de 2008 e Março de 2009, quando as consequências da crise internacional sobre o país já estavam à vista mas não eram ainda oficialmente admitidas; caso o tivessem sido, teria porventura sido possível uma acção mais atempada na prevenção de algumas situações de desemprego causadas por falências oportunistas, por exemplo; teria sido possível a introdução de medidas com maior recuo, mais imaginativas, capazes de mitigar alguns dos efeitos da verdadeira sangria de emprego a que assistimos durante o decurso de 2009.
Pode ser que isso tivesse inclusivé elevado o défice acima dos 9,3% - na pior das hipóteses -mas teria tido o mérito de ter dado um avanço precioso de seis a oito meses sobre o controlo da situação.
Nesta matéria o governo preferiu uma gestão à vista - coisa muito portuguesa - em vez da necessária reactividade estratégica, e dessa forma atrasou medidas anti-crise que, tendo sido tomadas tardiamente, anularam boa parte do seu próprio impacto potencial na manobra de inversão duma situação económica e social trágica.
A minha avaliação dessa reacção tardia não pode ser, como se depreende, positiva.
Bebinca
Há 11 minutos
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