Este governo continua a pautar-se por não querer dizer aos portugueses aquilo que eles não querem ouvir... devo dizer que a esta altura da crise isso não me tranquiliza nada. A importância do problema "endividamento externo" é largamente política, e assenta na credibilidade do país face ao exterior, relativamente à existência ou não existência de medidas que invertam o caminho em curso.
Dizer o que os portugueses não querem ouvir teria requerido, desde logo, um OE concentrado apenas no essencial, rompendo com a profusão de medidas avulso destinadas a tudo mas que resultarão, previsivelmente, em muito pouco. Ao querer abordar tudo e sem prioridades de emergência muito claras e focadas, o governo esquece-se do essencial e com isso coloca em risco, verdadeiramente, a própria continuidade do estado social e talvez, a prazo, a própria democracia. Por outro lado, o executivo está atrasado na apresentação do PEC. Muito atrasado.
Dizer aquilo que os portugueses não querem ouvir seria, nestes tempos difíceis, elucidar que medidas de fundo tomará já este ano para reduzir a despesa pública corrente, para fomentar o investimento externo e o emprego mais a sério, para limitar o desemprego, para cortar nas altas pensões, para reduzir a dívida, para manter ou estimular a procura de bens nacionais no mercado interno e, também, para introduzir mais justiça fiscal sobre a banca, sobre a bolsa, sobre as empresas financeiras de forma geral e sobre a saída de capitais do país e o recurso aos offshore e ao planeamento fiscal agressivo. Sócrates tem, ainda e pelo meio, de consertar um sistema judicial seu inimigo - e inimigo de todos os que o querem reformar - e alterar leis e precedimentos criminais de forma a que gestores do género dos que tivémos no BPN e no BPP tenham um lugar claro à sua espera: a cadeia.
Quanto aos grandes projectos, como o TGV ou o aeroporto, penso que devem continuar na agenda política, mas também que é incontornável o seu adiamento até o governo conseguir restaurar a credibilidade que ameaça perder face aos credores externos. O valor do défice relativo a 2009 não me parece permitir outra opção.
Enquanto persiste na tardança este governo afunda, e o seu erro fundamental deriva, como já antes registei, dum obstinado atraso no reconhecimento dos efeitos da crise sobre o país, em especial a partir de Outubro de 2008. Tal como Cavaco, Sócrates entrou em retrocesso não devido aos jornais mas quando decidiu criar a ilusão dum "Oásis" que não existia.
Não se lhe pede que passe a ser apenas mais um catastrofista, longe disso, mas pede-se-lhe que saiba ser mais pragmático na gestão da coisa pública.
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