O programa não é curto, no sentido por exemplo em que - para programa eleitoral - contém demasiadas intenções gerais (e avulsas, tal como criticam no caso do PS) mas demasiado poucas linhas de orientação claras, dentro das suas grandes 4 preocupações (Economia, Justiça, Solidariedade e Educação). É pouco inovador e chega a copiar intenções programáticas do PS e mesmo a repetir outras já postas em curso nesta legislatura. É um programa pouco imaginativo, embora contenha alguns pontos, ideias e intenções com mérito (lá chegarei noutro post).
Os seus pontos mais fortes, não por acaso, situam-se no que analisa/propõe quanto à Justiça e, em menor medida, quanto à Educação, onde é mais demagógico. Os pequenos pontos inovadores de que me apercebi estão sob o eixo da Solidariedade (embora dentro dele existam outros tantos que me causam inquietação).
É no campo económico o seu ponto mais fraco, começando pela absurda insistência em confundir a crise global em que nos inserimos com a crise estrutural portuguesa, para terminar num novo modelo económico assente nas exportações (o que exporta o Governo?).
Numa altura em que os melhores economistas do mundo afirmam (e praticam) que é a possibilidade dos Estados admitirem temporariamente mais défice e dívida a ferramenta que destingue esta crise duma depressão como a que ocorreu em 1929, o PSD insiste em cilindrar toda e qualquer visão em nome das contas em dia. É claro que as contas têm de ser postas em dia, mas isso é um caminho, deve ser visto como uma tendência com o seu peso (não a qualquer custo) sobre a acção governativa.
Viveu-se em Portugal, durante 48 anos, uma visão exclusivista de "contas em dia", que deixou o país atrasar-se em quase todos os domínios estratégicos, do investimento às infra-estruturas que o teriam deixado melhor preparado quer para a entrada na Europa quer para a globalização com que hoje se debate.
Também nessa altura, a visão de Portugal no mundo era essencialmente inexistente, isolada, esmagada pela máscara das "contas em dia", de país "pobrezinho mas honrado".
Falta ao PSD perceber que governar o país é muito diferente de gerir uma empresa - embora seja verdade que existam semelhanças nalguns aspectos.
Essa falta de aposta, de visão e leitura estratégica de quase meio século veio a ter o peso social que conhecemos (e também económico, pois tivémos de pagar mais tarde e mais caro as infra-estruturas de transportes, de saúde, de educação, que antes pouco tínhamos).
O desenvolvimento é uma responsabilidade inter-geracional; a dívida é uma parte integrante da gestão, quer do Estado, quer das empresas.
A questão crucial é pois tão somente enveredar por um desenvolvimento que, sendo-nos necessário, não entre na insustentabilidade. E o limite desse caminho é traçado pela aposta estratégica, que o programa do PSD não faz.
É desolador, e demagógico, identificar uma mudança de paradigma do motor económico para apontar as exportações. As exportações podem ser um resultado, não são um meio, um caminho, uma estratégia que o Governo possa accionar, ou até um modelo realista que possa ser exclusivo para a geração de crescimento económico e bem-estar.
Para além disto, estou em total desacordo com a intenção (discreta, mas presente) de encetar o caminho da privatização da Saúde e das Pensões, ou seja, o caminho de desmantelamento progressivo do Estado Social, em vez de pugnar pela melhor eficiência da gestão pública, estabelecendo as condições necessárias para a saudável co-existência com prestadores privados nessas duas áreas, em papel complementar.
Não é preciso dar cabo dos sistemas públicos - que de resto têm vindo a melhorar, vd. listas de espera - para criar oportunidades de negócio aos privados mas, se a escolha do PSD é encetar o desmantelamento desses serviços públicos em benefício dos privados, então esqueçam as exportações, porque o que vai acontecer será a corrida dos privados a essa última árvore de patacas.
Este ponto (dirigismo na privatização da Saúde e das Pensões) e o anterior (o simplismo de encarar as exportações como novo "modelo") - omissos quanto ao "como", revelam uma fragilidade estratégica enorme, falta de visão, e a intenção de encetar novos experimentalismos arriscados, que nesta altura tenho de considerar mais megalómanos - e perigosos - do que o TGV.
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