"Se fosse oposição, só discutia depois de conhecer o Orçamento de Estado", disse Ulrich, o banqueiro. Acontece que o Sr. Ulrich não é oposição. Ou talvez seja, mas não queira dizer. Ou então é e não é, o que nos atira para os domínios da mecânica quântica que, contudo, não serve à escala macroscópica em que se move o Sr. Ulrich.
Vou-lhe perdoando as patacoadas que tem vindo a proferir, em perfeito desrespeito das suas funções, porque permaneço cliente do banco que dirige... por enquanto.
Mas era melhor ganhar juízo, Sr. Ulrich... Não aprendeu nada com o seu antecessor?
Não sei quantas almas tenho. Cada momento mudei. Continuamente me estranho. Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.
Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: «Fui eu?»
Deus sabe, porque o escreveu.
Fernando Pessoa
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