O senhor Francisco Van Zeller afirmava há dias acerca dos desenvolvimentos recentes na Auto-Europa que “trata-se de centenas e centenas de trabalhadores que acabam de ficar sem trabalho porque alguns querem ser pagos com algumas percentagens e ao sábado”.
Ora aquilo que a VW está a fazer na Auto-Europa, já desde há alguns anos, parece ser lançar periodicamente o espectro do fecho, na esperança de redução do seu pessoal de forma mais contida e incremento da produtividade do pessoal remanescente à custa de laboração mais prolongada.
É preferível aumentar a rentabilidade de uma unidade industrial do que optar pelo seu fecho efectivo, claro. Para mais, pode aceitar-se que isso suceda numa indústria onde a produtividade está gerida ao máximo da eficiência, o que anda muito longe de ser o caso da maioria da indústria nacional.
No entanto, parece-me, o verdadeiro objectivo da VW não se prende apenas como uma necessidade de gestão de curto prazo, antes com medidas de sustentabilidade para conviver com um período de carência de procura que não se adivinha ser curto.
Dito isto, nunca pode ser simpático, nem aceite de bom grado, trabalhar-se "à borla", como o senhor van Zeller pretende que se aceite. Será um mal necessário, talvez, mas daí a aceitar-se como solução inevitável, vai uma grande distância.
O senhor van Zeller não quer que o Governo intervenha. É claro que não. Mas ele, o senhor van Zeller, já pode intervir... E porquê?
Porque a parte medíocre da indústria portuguesa espera tirar do precedente da Auto-Europa os devidos dividendos. Visão? Preparação para o futuro? Nada. Puro situacionismo de curto prazo, típico açoite e castigo, enfim, a solução mais fácil (desde que seja a VW a tomá-la primeiro...).
Atente-se na falta de consciência das declarações do senhor van Zeller: “Em tempos bons tudo funciona bem. A produtividade é muito alta. A qualidade é elevadíssima o que faz com que aquela fábrica seja uma jóia no grupo VW. Se perdem esta característica passam a ser uma fábrica vulgar. E como fábrica vulgar representa 1,3% das vendas da VW. Apaga-se com uma borracha”.
Pode ser que o senhor van Zeller tenha sido promovido a consultor da VW, não se sabe...
O que ficamos a perceber das suas palavras parece ser que, em tempos de vacas gordas, é preciso açoitar-se os mesmos, a bem dos lucros, e em tempos de vacas magras, também é preciso açoitá-los, a bem da sobrevivência.
Eis a versão incontida, da noção de responsabilidade social do senhor van Zeller: a vidinha das pessoas que trabalham nalgumas empresas deve ser considerada tão frágil que a possamos apagar com uma simples "borracha"...
Mas há mais: “não há direito de uma Comissão de Trabalhadores fazer ajoelhar uma empresa só porque quer sábados”. Claro que não senhor van Zeller, mas já há direito a ofender a dignidade de quem trabalha com esse tipo de afirmações fora de tom? Que ajoelhem sempre os mesmos, e de preferência da forma mais humilhante?
Ao insultar e velipendiar a dignidade pessoal e profissional de milhares de colaboradores da VW - varrendo de uma assentada preguiçosos e aplicados, competentes e incompetentes, todos pela mesma fivela - o senhor van Zeller só deita gasolina numa perigosa fogueira. A VW não lhe agradecerá.
Enfim, é a sensibilidade do costume, mas para pior. Meu caro amigo, os tempos já não são os seus. Não parece que o futuro passe por si.
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