Um texto de Leonel Moura:
"Concebida inicialmente para servir os militares, a Internet, tal como a conhecemos, emergiu à margem de todos os poderes. O poder político não se apercebeu que nascia um novo meio de comunicação, que pela sua natureza, rizomática, depressa se tornaria incontrolável.
O poder económico levou muito tempo a entender "como se podia ganhar dinheiro com aquilo" e deixou que a net se desenvolvesse numa lógica não comercial. Intelectuais, académicos, gente da cultura começaram por a rejeitar e depreciar em nome da arrogância habitual de quem se considera ser o guardião do saber. Para mais, ninguém, de tanto pensador e especialista que ocupa telejornais e a nossa paciência, foi capaz de antever a importância da rede.
Assim, graças a esse desinteresse geral, foi possível montar a Internet segundo um modelo absolutamente inovador na longa história da sociedade humana: o da liberdade. De tal maneira que até hoje continua a não existir nada tão livre como a Internet.
Tivesse ela sido criada por governos e assentaria num vasto pacote de leis restritivas, com imensos mecanismos de censura e bloqueio, policiamento, limites territoriais, bilhete de identidade, enfim, o habitual. Mas como os poderes demoram sempre muito tempo a reagir ao realmente novo, a teia foi alastrando, ultrapassando preconceitos e fronteiras - chegando mesmo àqueles lugares inóspitos onde ainda mandam ditaduras e totalitarismos - ligando pessoas e cérebros na sua criatividade e plena expressão livre. Hoje a net constitui um gigantesco organismo vivo, uma nova entidade planetária que representa um novo estádio da civilização humana.
Contudo, a partir do momento em que a Internet se tornou uma realidade incontornável logo surgiram em força os seus inimigos. Na primeira linha os homens de negócios. Incapazes de perceber o potencial de um cérebro em rede, sempre a encararam, até hoje, como uma mera traficância de venda a retalho. Muito poucos passaram da mercearia dos acessos.
Logo a seguir todos aqueles, e são muitos, os que odeiam a liberdade. Não há dia que não se tente demolir a net jogando com o sujo argumento do medo. Perigos, fraudes, spam, pedofilia, pornografia, desvio das crianças, arma perversa dos adultos, terrorismo, insegurança, pirataria, vírus, tudo serve para tentar reduzir a Internet a mais um canal de televisão. Ou seja, um meio de comunicação alienante, dominado pelos interesses privados, controlado pelos poderes políticos, de liberdade condicionada.
Ainda recentemente o Parlamento Europeu tentou impor uma directiva que para além da introdução da censura - sob o pretexto da defesa dos direitos dos autores - pretendia conceder aos fornecedores de serviços a possibilidade de limitar o acesso a determinados sites. Ou seja, passaríamos a ter de comprar pacotes de sites, um pouco como hoje se compram pacotes de canais de TV. Isto, que significaria o fim da Internet, felizmente não passou. Mas eles voltarão à carga.
A questão não é moral nem ideológica. A Internet revelou ser um poderoso meio de evolução positiva das sociedades e dos indivíduos. Precisamente por ser extremamente livre, permite a expressão de múltiplas e muito diversas ideias, más e boas naturalmente, mas que no seu conjunto geram uma dinâmica de criatividade única na história. Por outro lado, tendo-se tornado na grande enciclopédia que reúne praticamente todo o saber acumulado pela humanidade, assim como lugar de divulgação por excelência do novo saber que vai emergindo, representa um poderoso acelerador de conhecimento, inovação e desenvolvimento tecnológico. E, por fim, a sua grande abertura e interconectividade permitiu gerar novas redes de relacionamento social, aproximar pessoas, fomentar a cooperação, gerar novas solidariedades.
Pretender introduzir mecanismos de censura e impor limitações, não é por isso só um atentado às liberdades, é sobretudo uma perfeita estupidez que só pode levar a sociedade a regredir.
Manter a Internet livre não é uma simples reivindicação de cibernautas. É a mais importante batalha que se trava actualmente em prole do avanço civilizacional. "
Moçambique pós-Natal
Há 4 horas
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